Transcendendo
o acadêmico em diria;ao aos caminhos da realização artistica vivenciei
situações e emoções peculiares. Desde a escolha ancestral do tema da pesquisa,
as angustias e alegrias passadas e vividas, as pessoas que perdi e as que
ganhei, na sublimação dos afunilamentos e expansões no decorrer do processo da
pesquisa.
No
Adro de Congonhas, me descobri e me vi. A imposição, sem escolha, da descoberta
da culpa e do pecado como caminho de conhecimento e amadurecimento das relações
e dos sentimentos do Homem ... Quando se esta muito distante dos desejos e
emoções pessoais e se arrisca um olhar interior mais aprofundado, depara-se, na
maioria das vezes, com monstruosas dificuldades, impostas pela moral, pela
educação religiosa e pelas regras sociais. Neste contexto a obra do aleijadinho
inaugurou alguns caminhos para a minha viagem interior. Ele abriu as portas
trancadas da emoção e me conduziu sorrateiramente as dimensões insondadas, onde
é permitido vivenciar a morte, a vida, o ódio, o amor e todas as possibilidades
secretas do coração, da razão e das sensações, sem os bloqueios cotidianos.
No
Adro de Congonhas, não há lugar para a
inocência, ali se descobre que existe pecado, que se é pecador e que a culpa é
o maior castigo e o maior caminho para a sublimação. E aí os Profetas
"acusa dores", percebem quando o "observa a dor" esta
preparado para o conhecimento maior e o libertam do peso petrificado do pecado
e tiram do "observa" a "dor", e instauram a "observa a ação". Desta forma os
Profetas do Aleijadinho humanizam o olhar dos que observam, despertando para o movimento
a ação interior.
No
Adro, o meu olhar foi gradualmente humanizado e na "expect ativa" fui
libertada para o grande vôo mediado e indicado pelo gesto do Profeta Abdias, no
espaço infinito
e atemporal do abraço de
Deus; um Deus Pai que dança com os Profetas de Congonhas. Ao despertar destas reações
internas no ato de
observar a obra vivenciei o drama de criar a ação, em um impulso criador que se
concretizou através do meu silencio, da minha negação e da disposição de transformar estas fraquezas em forças
na determinação
de estruturar a desordem
em ordem, e no empenho da realização teórica e prática da dança
dos Profetas em Movimento.
Durante
o trabalho de pesquisa me expus ao ridículo e ao maravilhoso, tanto no papel de
observadora quanto no papel de realizadora a partir da tradução/interpretação
da obra observada. 0
resultado dessa "realiza ação" é rico na sua multiplicidade, os
"observa dores" serão vários e várias serão as suas fruições.
Com os Profetas aprendi a
aliança com
o Divino, na caminhada e na luta quotidiana pela eterna organização
do caos e reconstrução
do "mundo novo".
E a minha dança e a
minha oração, o
meu aprendizado e a minha poesia, a forma de expressar os meus sentimentos
diante da realidade da vida. Ao final desta etapa salmodiarei como Davi:
"(
... ) Transformaste o meu luto em dança, e minha roupa de luto em roupa de
festa. Por isso o meu ser canta para ti, e jamais se calará. Javeh meu Deus, eu te louvarei para sempre (SI
30, 12-13).”
Por Soraya Maria Silva - Unicamp - 1994